sábado, 9 de maio de 2009

COMPROMISSO COM O ALUNO : QUEM É ELE ? COMO VIVE ? O QUE PENSA ? COMO PODE APRENDER MAIS E MELHOR?


REGINA BEZERRA CARVÃO

O professor / tutor ao definir e selecionar mídias e tecnologias na EAD deve estar principalmente compromissado em descobrir quem é seu aluno, como ele vive, o que ele pensa, como ele está aceitando, apreendendo , se apropriando e usando o conhecimento construído.

Para esta descoberta é fundamental o uso do tom dialogal com a preocupação de envolver o aluno na mesma convivência construtiva. Entenda-se por diálogo “troca ou discussão de idéias, de opiniões, de conceitos, com vista à solução de problemas, ao entendimento ou à harmonia; comunicação” Aurélio Buarque de Holanda Ferreira in Novo Dicionário Aurélio , e não apenas “usar o recurso de escrever um parágrafo inteiro e lá no finalzinho colocar uma pergunta do tipo: Vamos em frente? Certo? Concorda?” Márcia Leite e Maria Cristina Baeta Neves in Mídia Escrita.

Quando se pensa em mídias e tecnologias é essencial também se pensar em novas metodologias. A exemplo da alfabetização que se faz utilizando a escrita, seria muito interessante que também a educação para mídias e tecnologias se fizesse utilizando-se de mídias e tecnologias.

Com uma caneta ou com um mouse ” Juliane Corrêa in Mídias e Tecnologias da Informação na Educação , com texto impresso ou com e-book , as mídias e tecnologias na educação podem contribuir para que se desenvolva a capacidade criativa dos alunos, motivando-os a se apropriar das mensagens, transforma-las, interferir no seu conteúdo e produzir colaborativamente novos conceitos e formas, descobrindo-se então criadores.


A EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA NO MUNDO, A LEGISLAÇÃO BRASILEIRA E A GLOBALIZAÇÃO

RE


 REGINA BEZERRA CARVÃO

 No ensino a distância a comunicação entre o professor e o aluno pode se realizar através de textos impressos, meios eletrônicos, mecânico ou outras técnicas ...(MOORE) , trata-se pois de um processo de ensino-aprendizagem que requer todas as condições gerais dos sistemas de instrução : planejamento prévio , orientação do processo , avaliação e retroalimentação ...(SARRAMONA)  . Abrange as formas de estudo que não são dirigidas e/ou controladas pela presença do professor na aula ...(ZAMORA) de tal modo que qualquer pessoa independentemente de tempo e espaço , possa converter-se em sujeito protagonista de sua própria aprendizagem ...(MARTINEZ) pela ação sistemática e conjunta de diversos recursos didáticos e o apoio de uma organização tutorial ... (GARCIA ARETIO)  .O ensino/educação a distância é um método de distribuir conhecimentos , habilidades e atitudes ...(OTTO PETERS)."



PANORAMA DA EAD NO MUNDO ATUAL



É neste contexto que a EAD desempenha um papel de fundamental importância ao apropriar-se das novas tecnologias disponíveis e aplicá-las na educação, compartilhando o conhecimento através de um processo interativo baseado na estreita cooperação entre tutores e cursistas. Este compartilhamento do saber possibilita a maior democratização da informação que é o maior bem destes nossos novos tempos.

As políticas educacionais públicas, ao privilegiarem os bons projetos de EAD além de fazerem educação a um custo menor do que em cursos presenciais, estarão criando oportunidades para milhões de pessoas terem acesso a novas oportunidades de aprendizagem, seja para os desempregados estruturais cujas funções foram substituídas por novas tecnologias, para os jovens que sequer estão inseridos no mercado de trabalho, ou ainda para os empregados manterem seus empregos através de constante atualização.

Bons projetos de EAD são aqueles que fazem antes de tudo educação com qualidade e constante avaliação do produto e do processo, que não fazem apenas a transposição do conteúdo de um curso presencial para um curso de EAD, que sabem que tanto a EAD quanto a Educação Presencial são processos educativos, qualificam o conhecimento do grupo e sabem principalmente que o conteúdo importa muito mais do que a tecnologia.

As tecnologias da informação e da comunicação se convertem em tecnologias educativas na medida em que são utilizadas como estratégias de ensino aprendizagem, e não como meros recursos de demonstração” Juliane Corrêa in Sociedade da informação globalização e educação a distância. Observamos que esta afirmativa é inteiramente procedente, ao assistirmos a programação nacional e/ou internacional de televisão a cabo, que embora conte com produção impecável, apresentação e conteúdos excelentes, sempre deixa a sensação de que muito pouco ficou para reflexão e aprofundamento das questões ali tratadas.

Esta sensação “de que muito pouco ficou“ é justamente porque a proposta desta tecnologia , (no caso a programação da televisão a cabo), apesar de ter muita informação e comunicação de qualidade é na essência entretenimento e/ou mero recurso de demonstração.

São necessárias estratégias de ensino aprendizagem para que esta tecnologia, e todas as outras existentes, se transmutem em tecnologias educativas.

A possibilidade desta transmutação existe, todos os diversos meios poderão se tornar tecnologias educativas, desde que acompanhados de uma proposta pedagógica e de professores especializados, criativos e competentes em compartilhar o saber e motivar os alunos a serem receptores críticos, professores que façam a ponte entre os alunos e o conhecimento, entre alunos e alunos, facilitando desta forma a “construção coletiva, colaborativa e cooperativa”. Sandra Rodrigues da S. Dias in Fórum 5 –PÓS EAD0206 – SENAC/RIO

A proposta pedagógica da EAD também renova a educação presencial ao introduzir disciplinas não presenciais ao currículo do ensino superior (portaria 2253 / 2001), ao trazer novas concepções de pesquisas e principalmente a quebra do mito de que alunos não gostam de ler e escrever. Esta quebra se verifica no momento em que favorecemos o acesso a internet e os vemos totalmente absorvidos na leitura e escrita, proporcionados por esta conexão.

Entre 2001 e 2005 a oferta em EAD mais do que triplicou, este acréscimo é provavelmente uma resposta a um atendimento competente. Respostas competentes sempre geram novas demandas.

Segundo o Anuário Brasileiro Estatístico de Educação Aberta e a Distância" www.abraead.com.br/anuário)  das 166 instituições brasileiras  de EAD pesquisadas 24% são  públicas.

Como 76% das instituições de EAD em funcionamento são particulares, embora a maioria seja sem fins lucrativos, constatamos que, temos ainda uma grande demanda reprimida.

Decididamente não é fácil fazer EAD, mas é fundamental que se enfrente este desafio, através da construção de políticas públicas que universalize seu acesso, sem perdas de suas qualidades fundamentais.



A LEGISLAÇÃO BRASILEIRA E A EAD

O decreto 5622 legitima a EAD  colocando-a no mesmo nível da educação presencial ao contemplá-la com os mesmos direitos e deveres. Esperamos que não haja retrocesso e que o resultado deste trabalho intenso de valorização e reconhecimento da EAD seja inteiramente respeitado. Quanto às avaliações presenciais, tão polemizadas, concordo com a necessidade de que elas sejam mesmo presenciais, até que a legitimação desta modalidade de educação não deixe mais dúvidas quanto sua assertividade e qualidade.

A GLOBALIZAÇÃO

Tomando a igreja católica como exemplo, observamos que a globalização é praticada há séculos, elas têm o mesmo ritual,de norte a sul do planeta.

No Brasil colônia, já explorávamos e cultivávamos aqui, o que seria manufaturado na Europa, portanto a diferença principal entre o que se nomeia hoje globalização e o que se praticava há séculos é a questão da “economia centralizada na mesma unidade de tempo real“ que Manuel Castell in Sociedades em rede, tão bem define como sendo “ as atividades econômicas centrais, nucleares de nossas economias que trabalham como uma unidade em tempo real, a nível planetário através de uma rede de conexões”.

Esta rede “corresponde a uma forma de divisão transnacional do trabalho que implica na distribuição de tarefas e funções entre as nações, ampliando sua ação do nível nacional para o global, utilizando-se das novas tecnologias da informação e comunicação”. Juliane Corrêa in Sociedade da informação, globalização e educação a distância.

Concluindo, retorno ao início deste texto, reafirmando o que penso ser a principal missão da EAD: ” apropriar-se das novas tecnologias disponíveis e aplicá-las na educação, compartilhando o conhecimento através de um processo interativo, baseado na estreita cooperação entre tutores e cursistas, possibilitando assim a maior democratização da informação - maior bem destes nossos novos tempos”.







CAMINHOS DAS TECNOLOGIAS DA INFORMAÇÃO E COMUNICAÇÃO : DE RECURSOS DE DEMONSTRAÇÃO A ENSINO APRENDIZAGEM

REGINA BEZERRA CARVÃO


Esta aí uma questão que sempre me intrigou ...

Assisto diariamente, há muitos anos, televisão “a cabo“, passo inúmeras horas do meu tempo reservado ao lazer assistindo programas nacionais e internacionais, que embora contem com produção impecável, apresentação e conteúdos excelentes, me deixam sempre com a sensação de que muito pouco fica para reflexão e aprofundamento das questões ali tratadas.

Concluo agora, durante a reflexão para justificar a assertiva acima, que esta sensação “de que muito pouco fica“ é justamente porque a proposta desta tecnologia (no caso a programação da televisão a cabo) apesar de ter muita informação e comunicação de qualidade é na essência entretenimento e/ou mero recurso de demonstração.

São necessárias estratégias de ensino aprendizagem para que esta tecnologia, e todas as outras existentes, se transmutem em tecnologias educativas.

A possibilidade desta transmutação existe, todos os diversos meios poderão se tornar tecnologias educativas, desde que acompanhados de uma proposta pedagógica.

A GLOBALIZAÇÃO E SUAS POSSÍVEIS INTERFERÊNCIAS NA EDUCAÇÃO À DISTÂNCIA

REGINA BEZERRA CARVÃO 

Assim como a tecnologia está presente nos mais simplórios atos, exemplos: ao se verificar um saldo bancário, ao se retirar através da rede bancária até mesmo o benefício mínimo pago às classes trabalhadoras com menor renda, ao solicitar um número de telefone ao serviço de informações , a globalização também, queiramos ou não é um fato real nas nossas vidas.

Quer sejamos tecnofóbicos ou tecnofílicos ou globalfóbicos ou globalfílicos temos que conviver com estas realidades cotidianamente, aceitando que tanto as novas tecnologias quanto a globalização são processos irreversíveis.

A globalização é praticada há séculos, a igreja católica por exemplo tem o mesmo ritual ,o mesmo serviço oferecido, as mesmas tabelas de preços, as mesmas palavras , a mesma arquitetura , os mesmos cânticos, o mesmos objetivos, do Afeganistão ao Zimbábue . No Brasil colônia , já fazíamos aqui o açúcar que adoçaria vários países europeus, explorávamos o ouro que dentre outras finalidades fariam as jóias das coroa, cultivávamos o algodão que confeccionaria as roupas européias, portanto a diferença principal entre o que se nomeia hoje globalização e o que se praticava há séculos é o acelerado ritmo do atual progresso tecnológico, que chega a dobrar seus conhecimentos a cada 5 anos .

Estas novas tecnologias tornam imperativa a aquisição de novas habilidades,competências e a constante atualização destas habilidades e competências adquiridas. É neste contexto que a EAD desempenha um papel de fundamental importância ao apropriar-se das novas tecnologias disponíveis e aplicá-las na educação, repartindo o conhecimento através de um processo interativo baseado na estreita cooperação entre tutores e cursistas. Esta repartição do saber possibilita a maior democratização da informação que é o maior bem a ser partilhado nestes nossos novos tempos

As políticas educacionais públicas ou particulares, quer seja em cursos formais ou informais ao privilegiarem os bons projetos de EAD estarão criando oportunidades para milhões de pessoas terem acesso a novas oportunidades de aprendizagem, seja para os desempregados estruturais cujas funções foram substituídas por novas tecnologias, para os jovens que sequer estão inseridos no mercado de trabalho, ou ainda para os empregados manterem seus empregos através de constante atualização e estarão fazendo educação a um custo 6 vezes menor do que os cursos tradicionais.

Bons projetos de EAD são aqueles que fazem antes de tudo educação com qualidade e constante avaliação do produto e do processo, que não fazem apenas o transporte do conteúdo de um curso presencial para um curso de EAD, que sabem que tanto a EAD quanto a Educação Presencial são processos educativos , qualificam o conhecimento do grupo e sabem principalmente que o conteúdo importa muito mais do que a tecnologia.

EAD - EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA


ANA FLORES E REGINA BEZERRA CARVÃO


É quase como a pergunta do comercial “Tostines vende mais porque é mais fresquinho ou é mais fresquinho porque vende mais?” A oferta está aumentando pelos dois motivos, como uma resposta a uma demanda reprimida e como conseqüência do atendimento competente a essa demanda. À medida que se criam, inovam-se e atualizam-se os recursos técnicos de cursos a distância, haverá demandas de diferentes partes do país e de diferentes perfis de “clientes” a se interessarem por essa modalidade de estudo. As inovações nos recursos e as possibilidades de acesso à educação em lugares antes impensáveis atraem cada vez mais novos usuários, aumentando a demanda aos cursos a distância.

 Na iniciativa pública, esses espaços estão crescendo timidamente. Segundo o Anuário Brasileiro Estatístico de Educação Aberta e a Distância - Abraead, das 116 instituições brasileiras de EaD pesquisadas, apenas 24% são públicas. A nova concepção de educação pode não conseguir preencher todos os espaços vagos de uma vez, alguns custarão mais a ter acesso; mas com a renovação constante dos recursos tecnológicos, principalmente se baseados em vontade política de se levar o ensino a todos os rincões do País, a EaD poderá chegar a regiões nunca antes atingidas nem pela educação tradicional.

Quaisquer que sejam os espaços criados, de uma maneira ou de outra sempre haverá segmentos que não terão acesso a estes, especificamente, mas que poderão se beneficiar de outros espaços e recursos tecnológicos, sejam eles um simples curso via Correio, um programa radiofônico ou um curso interativo por vídeos ou computadores de última geração. A criação de espaços, em lugar de ser considerado um ponto negativo da EaD ou a razão de novas marginalizações,  são novas portas que se abrem a um número crescente de pessoas, mesmo que isso ocorra em tempos diferentes para cada grupo. Mas tendo em mente o fato de que, de acordo com o Abraead, 76% das instituições EaD em funcionamento são particulares,  significa que ainda há muita coisa a ser feita no setor.

 



JESÚS MARTÍN-BARBERO : A ESCOLA ESTÁ FECHADA A CULTURA AUDIOVISUAL E DIGITAL

REGINA BEZERRA CARVÃO


Concordo com a afirmação do autor e parece-me que existe uma fantasia de que todo o conhecimento universal está prontinho nos esperando na internet, mas eu penso que este conhecimento se constrói a cada instante integrando a cultura das letras com a cultura digital.

Esta integração, em parte, já existe, porque o que mais encontramos na cultura digital são textos escritos. O que se faz necessário é a escola utilizar melhor as TICs assumindo a responsabilidade de descentralizar a produção de conhecimento e de cultura ousando novas idéias, experimentando sempre o novo.

Em vez de ficar criticando os meios de comunicação e esperar que a internet faça o milagre, cabe a escola criar métodos coletivos de produção e as novas possibilidades de linguagem para os meios audiovisuais e digitais, valorizando as culturas regionais.

Educar hoje, é também saber utilizar as TICs como instrumentos de construção da educação abandonando a postura de acumulação passiva e reprodutiva de conteúdos.

Mesmo que a escola possua computadores suficientes para todos os alunos, se não se fizer presente o comprometimento com a inovação pedagógica, todo este equipamento corre o risco de se transformar em máquinas de.entretenimento e/ou mero recurso de demonstração.

São necessárias estratégias de ensino aprendizagem para que toda esta tecnologia, se transmute em tecnologias educativas.

A possibilidade desta transmutação existe, todos os diversos meios poderão se tornar tecnologias educativas, desde que acompanhados de uma proposta pedagógica.

Finalizando quero transcrever um texto de  Pierre Levy, muito adequado a esta tarefa : “ É possível navegar na web e usar o correio eletrônico sem possuir computador se houver uma política ambiciosa de equipar salas comunitárias abertas ao público nos bairros e regiões pobres, o principal obstáculo à participação não é a falta de computador, mas sim o analfabetismo e a falta de recursos culturais. É por isso que o esforço para a educação, a inovação pedagógica, a formação intelectual e o “capital social” são os fatores chave do desenvolvimento da inteligência coletiva.” In www.nova-e.inf.br/nomes/pierrelevy.htm

PASSEIO SOCRÁTICO

FREI BETO



Ao visitar em agosto a admirável obra social de Carlinhos Brown, no Candeal, em Salvador, ouvi-o contar que na infância, vivida ali na pobreza, ele não conheceu a fome. Havia sempre um pouco de farinha, feijão, frutas e hortaliças. "Quem trouxe a fome foi a geladeira", disse.

O eletrodoméstico impôs à família a necessidade do supérfluo: refrigerantes, sorvetes etc. A economia de mercado, centrada no lucro e não nos direitos da população, nos submete ao consumo de símbolos. O valor simbólico da mercadoria figura acima de sua utilidade. Assim, a fome a que se refere Carlinhos Brown é inelutavelmente insaciável.

É próprio do humano - e nisso também nos diferenciamos dos animais - manipular o alimento que ingere. A refeição exige preparo, criatividade, e a cozinha é laboratório culinário, como a mesa é missa, no sentido litúrgico.

A ingestão de alimentos por um gato ou cachorro é um atavismo desprovido de arte. Entre humanos, comer exige um mínimo de cerimônia: sentar à mesa coberta pela toalha, usar talheres, apresentar os pratos com esmero e, sobretudo, desfrutar da companhia de outros comensais.

Trata-se de um ritual que possui rubricas indeléveis. Parece-me desumano comer de pé ou sozinho, retirando o alimento diretamente da panela.

Marx já havia se dado conta do peso da geladeira. Nos "Manuscritos econômicos e filosóficos" (1844), ele constata que, "o valor que cada um possui aos olhos do outro é o valor de seus respectivos bens".

Portanto, em si o homem não tem valor para nós. "O capitalismo de tal modo desumaniza que já não somos apenas consumidores, somos também consumidos. As mercadorias que me revestem e os bens simbólicos que me cercam é que determinam meu valor social.

Desprovido ou despojado deles, perco o valor, condenado ao mundo ignaro da pobreza e à cultura da exclusão.

Para o povo maori da Nova Zelândia cada coisa, e não apenas as pessoas, têm alma. Em comunidades tradicionais de África também se encontra essa interação matéria-espírito. Ora, se dizem a nós que um aborígene cultua uma árvore ou pedra, um totem ou ave, com certeza faremos um olhar de desdém.

Mas quantos de nós não cultuam o próprio carro, um determinado vinho guardado na adega, uma jóia?

Assim como um objeto se associa a seu dono nas comunidades tribais, na sociedade de consumo o mesmo ocorre sob a sofisticada égide da grife.

Não se compra um vestido, compra-se um Gaultier; não se adquire um carro, e sim uma Ferrari; não se bebe um vinho, mas um Château Margaux. A roupa pode ser a mais horrorosa possível, porém se traz a assinatura de um famoso estilista a gata borralheira transforma-se em cinderela...

Somos consumidos pelas mercadorias na medida em que essa cultura neoliberal nos faz acreditar que delas emana uma energia que nos cobre como uma bendita unção, a de que pertencemos ao mundo dos eleitos, dos ricos, do poder. Pois a avassaladora indústria do consumismo imprime aos objetos uma aura, um espírito, que nos transfigura quando neles tocamos. E se somos privados desse privilégio, o sentimento de exclusão causa frustração, depressão, infelicidade.

Não importa que a pessoa seja imbecil. Revestida de objetos cobiçados, é alçada ao altar dos incensados pela inveja alheia. Ela se torna também objeto, confundida com seus apetrechos e tudo mais que carrega nela, mas, não é ela: bens, cifrões, cargos etc.

Comércio deriva de "com mercê", com troca. Hoje as relações de consumo são desprovidas de troca, impessoais, não mais mediatizadas pelas pessoas.

Outrora, a quitanda, o boteco, a mercearia, criavam vínculos entre o vendedor e o comprador, e também constituíam o espaço das relações de vizinhança, como ainda ocorre na feira.

Agora o supermercado suprime a presença humana. Lá está a gôndola abarrotada de produtos sedutoramente embalados. Ali, a frustração da falta de convívio é compensada pelo consumo supérfluo. "Nada poderia ser maior que a sedução" - diz Jean Baudrillard - "nem mesmo a ordem que a destrói."

E a sedução ganha seu supremo canal na compra pela internet. Sem sair da cadeira o consumidor faz chegar à sua casa todos os produtos que deseja.

Vou com freqüência a livrarias de shoppings. Ao passar diante das lojas e contemplar os veneráveis objetos de consumo, vendedores se acercam indagando se necessito algo. "Não, obrigado. Estou apenas fazendo um passeio socrático", respondo. Olham-me intrigados. Então explico: Sócrates era um filósofo grego que viveu séculos antes de Cristo. Também gostava de passear pelas ruas comerciais de Atenas. E, assediado por vendedores como vocês, respondia:

"Estou apenas observando quanta coisa existe de que não preciso para ser feliz".

quinta-feira, 7 de maio de 2009

CUIDAR É ESCUTAR

ROBERTO CREMA


Como cuidar? Antes de tudo, através da escuta, que é o primeiro mandamento; Shema Israel, Escuta Israel (1). Antes de falar de amor é preciso falar de escuta.

Porque a crise que testemunhamos a nossa volta é a do ab-surdo, de surdez, de falta de escuta.
Para os antigos Terapeutas, há três órgãos no corpo do homem de uma escuta inclusiva, que acolhe a inteireza do Instante. Esses órgãos são sempre pares e têm a forma de sementes: os pés, os rins e as orelhas.

Os pés escutam a terra, nossa mãe, a Pachamama, segundo a tradição andina.

Trata-se de abrir a escuta para o infra-humano, os reinos básicos que nos precedem e que encarnamos: o mineral, o vegetal e o animal.

Lembro-me de quando, há alguns anos, estive em Pucket, na Tailândia, esse local que foi arrasado pelo tsunami. Estava recebendo uma massagem ao ar livre, num local próximo à praia, quando o solo começou a tremer, como se estivesse sendo golpeado. Olhei para a frente e me deparei com um elefante, que caminhava pela praia. É quase certo que aquela massagista, como todas as suas colegas e habitantes daquela região foram tragados pela grande onda.

Entretanto, aquele elefante segue existindo, pois ele escuta a terra...

É interessante constatar que alguns antropólogos, após essa grande tragédia, que pesquisavam uma comunidade tribal numa região da Índia, também assolada pelo tsunami, lá voltaram para saberem se havia sobreviventes. Perplexos, constataram que todos os habitantes daquela comunidade tinham sobrevivido. Porque eles escutam os elefantes, as formigas, os pássaros. Eles escutam os sussurros da terra...

Através da escuta, é possível responder de forma consciente e responsável ao inesperado que nos chega. Não escutar a terra é o que nos torna tão frágeis diante das ondas inesperadas da crise, que nos submergem.

Os rins escutam o sangue, o interior de nós mesmos. “ Cinja teus rins!”, afirma a mensagem bíblica. A função dos rins é filtrar o sangue. Às vezes os pensamentos e sentimentos nos envenenam, afetando nossos rins. Esta é a escuta íntima do humano, de tudo que transcorre em nossas almas, para a qual estamos geralmente desatentos.

As orelhas, enfim, escutam o Céu, o grande Pai, o supra-humano.

Pelas orelhas, na escuta do Logos estamos em contato com a dimensão da Divindade e da Luz.

Na iconografia budista, o Buda é representado com grandes orelhas, indicando sua conexão com o Logos, a Inteligência Criadora. E ainda na escuta do Logos, para os orientais, há a simbólica de sabedoria do burro, com suas grandes orelhas, como um arquétipo crístico – por sua mansidão e por carregar o fardo humano. Há um livro de um junguiano com esse título: Burro, arquétipo de Cristo. Esse animal está presente na cena do presépio cristão e leva no lombo a pessoa de Cristo quando de sua entrada em Jerusalém na manhã de Páscoa, segundo a tradição cristã.


O terapeuta é alguém habilitado na grande arte da escuta, da terra e do céu, o coração do humano, síntese viva de todos os Reinos que nos habitam. O reino mineral encontra-se em nossos ossos e dentes; o reino vegetal na flora intestinal, no sistema vegetativo, na raiz dos cabelos, nas plantas dos pés; o reino animal na libido, nos instintos.

As vezes o que está doente em nós não é o humano, é o infra-humano. Antes de sermos bons seres humanos, precisamos ser bons animais – o que Freud bem observou - , bons vegetais, bons minerais. É por isso que , às vezes, um cristal pode curar o cristal partido em nós; o floral pode ser agente de cura para a nossa planta, a nossa flor, a nossa rosa ferida. Um animal, um gato, um cachorrinho, um cavalo pode exercer um ofício terapêutico, auxiliando a pessoa a restabelecer uma ponte de sensibilidade, uma conexão curativa.

Há, também, o trans-humano, o horizonte vasto e essencial do transpessoal. Porque , às vezes, o que está ferido em nós é uma estrela, um cosmo no exílio. O que sofre em nós, pode ser um anjo esquecido. Assim, o infra-humano e infrapessoal, o trans-humano e o trans-pessoal se encontram no ser humano, na sua alma e no seu coração integrados, através do resgate da consciência de inteireza.


(1) Shemá Yisrael (em hebraico שמע ישראל; "Ouça Israel") são as duas primeiras palavras da seção da Torá que constitui a profissão de fé central do monoteísmo judaico (Devarim / Deuteronómio 6:4-9) no qual se diz שמע ישראל י-ה-ו-ה אלקינו י-ה-ו-ה אחד (Shemá Yisrael Ad-nai Elokêinu Ad-nai Echad -